segunda-feira, 24 de fevereiro de 2025

Encontrei minha versão mais jovem pra tomar um café.

Encontrei minha versão mais jovem para tomar um café. 

O café é da tarde, nós duas nos atrasamos. 

Eu pedi 1 café sem açúcar. Ela pediu cerveja (da mais barata). 

Eu pedi um pão com ovo. Ela pediu outra cerveja.

Ela me contou que estava sedentária, tinha asco de dieta, que pouco se fodia para padrões capitalistas de beleza e se eu queria largar a mão de ser quadrada e pedir a 3a cerveja de litro para dividir com ela (que estava lisa).

Eu disse que não. Ela insistiu muito. Falei ‘não, porra, vai zuar meu shape’.

Ela retruca: que shape? Eu mostro o bíceps. 

Ela fica CHOCADA e propõe uma queda de braço. Eu falo que não é a hora de fazer uma queda de braço, afinal a ideia é que esse encontro fosse mais filosófico e terapêutico. Ela diz 'foda-se'. 

Eu ganho dela na queda de braço. Ela diz: melhor de 3. E perde 3 vezes.

Ela diz que entrará na academia e treinará para me vencer. Eu falo ‘eu sou você, porra!’. Ela fala ‘ah... é mesmo’. Eu pergunto ‘e só notou agora?’. Ela responde ‘eu nunca viraria 1 cuzona que não tem decência para acompanhar alguém num litrão’. Eu falo ‘ora, pois, virastes’.

Ela fica pensativa e me pergunta se eu enriqueci. Eu falei ‘querida, pelo estilo de vida que levamos, você tem mais é que se alegrar que chegou aos 30 intacta’.

Ela responde: 30?????? Eu confirmo ‘30’. Ela me diz que pediria outra cerveja, mas a grana acabou e que vai fazer amizade com o barman para ganhar outra.

Eu, bem ciente do vexame que está por vir, falo que não é para ela fazer isso. Discurso sobre a importância da saúde e como nunca é tarde para se precaver. Ela ignora e vai fazer amizade com o barman. Eu como meu pão com ovo e peço uma água.

Ela some por 40min e volta com meia garrafa de Askov. Eu fico encantada, de verdade, en-can-ta-da. Ela me pergunta se eu ainda consigo ganhar Askov de graça. Eu falo que tem outras formas de se morrer com 7 reais.

Ela diz: vamos sair pela noite, viver e sonhar. Eu, sabendo que a noite não teria fim, e para ganhar tempo, começo a falar sobre política. Digo algo polêmico e minto afirmando que o Aécio Neves virou presidente do Brasil e que ele foi ótimo porque era liberal. Ela me encara, bem no fundo dos nossos quatro olhos, ou melhor, oito, já que usamos armações, e fala por 50min sobre os males do liberalismo econômico enquanto esvazia a vodka. Ela tem salvo no celular 'A Internacional Comunista' e a coloca para tocar enquanto fala.

Eu, cansada, admito que era mentira, só para ela calar a boca. Ela gosta que eu saiba sobre o que ela gosta, eu gosto que ela goste que eu saiba do que ela gosta. E nos damos bem.

Ela me conta 10 piadas de tiozão. Eu rio das 10 e conto mais 20. Ela me chama para dançar. Eu falo “porque não?” e dançamos. 

Ela fala que eu sou muito massa e que bom que ela agora está ciente que tem garantidos mais dez anos e que vai aproveitar pra caralho até lá. Eu digo 'não, sua maluca!'. 

Ela me interrompe e me convida para tatuar uma cereja no seio pra testarmos o que acontece no espaço-tempo. Eu digo que talvez. E penso mesmo que talvez sim. Ela troca de assunto e balbucia sobre como é "top" ser hedonista, que o mundo é caos e só se vive uma vez, mas antes de terminar o raciocínio dorme sentada na cadeira. 

Eu a levo para casa, em segurança. Quando viro a esquina, noto que ela sai de casa como se não tivesse bebido nadica de nada, acende um cigarro e entra num carro suspeito com suas amigas.

Ah...

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