Sabe o porquê da paradeira neste blog?
Minhas unhas estavam muito... muito compridas. E não é por vaidade. Quem me dera! Mas por uma grande falta de administração do tempo.
Devo colocar a culpa na modernidade? Mais ou menos. Posso colocar?
Posso.
O barulho das unhas tocando o teclado me incomodava profundamente toda vez que eu me sentava para escrever algo pessoal. Podar essas garras se trata de uma, dentre várias, tarefas que fui adiando e adiando. Pelo menos há licença poética da feminilidade.
De todo modo, imaginei que eventualmente elas se quebrariam. Mas não. Muito pelo contrário.
Estas unhas toleraram um mês de impactos na capoeira, subidas e descidas no Pole Dance, aulas de ritmos brasileiros, outros sobes e desces do feed do Instagram, 8 horas diárias de trabalho + 25 horas extras. Toleraram dupla jornada de serviço, minha ansiedade de 3h de estudos diários, 1h30 de musculação, 6 vezes na semana, mais horas e horas de rolagem no feed, e ainda outras horas extras e...
Que unhas fortes!
Bem, pensei que precisava desabafar algo, há muito tempo, daí que finalmente procurei a tesoura. Quase desisti enquanto procurava a bendita tesoura. Mas não desisti. Cá estou, escrevendo com meus dedos livres, sem aquele "tac tac tac" chato.
Enquanto cortava, pensei que queria ter várias vidas para fazer tudo: cortar as unhas regularmente, lutar, desenhar, compôr... E saber por qual razão o acento do "compor" não sobreviveu ao Acordo Ortográfico.
Com mais uma vida, juro, eu leria o Acordo Ortográfico. Nesta, não dá! Já estou lendo cinco livros.
Marco Aurélio meditou que não adianta ao homem viver mais do que é permitido por sua natureza. Isso porque a vida é um ciclo que se repete infinitamente e nada seria tão novo quanto o momento presente. Duvido que ele não se espantaria com a vida moderna.
Ele ainda dizia que a vida era breve, mas com essa ocupação toda... ela não chega ao "bre".
A tecnologia me passava a ideia de otimização do tempo, mas ando é desconfiada que ela nos retira as coisas legais e nos deixa a sós com as chatices burocráticas. Não quero bradar contra o avanço do mundo. Nem terceirizar tudo e transformar esse texto numa lista de desculpas egoicas.
Talvez, se eu não ficasse duas horas diárias me comparando com bilhões de pessoas mais criativas, mais fortes e com unhas aparadas, quem sabe esse texto nem sequer teria existido - daria lugar a outro.
Tá bom que a tecnologia tem sua parcela... mas eu também.
Odeio, desde muito jovem, me reconhecer como parte da massa de manobra humana (coisa que faria Aurélio me repreender). Odeio me notar nos trechos de "Sociedade do Cansaço", de ser um bicho que se encanta pelas gangas da High Performance, da autocomparação compulsiva, do consumismo influenciado.
Tristemente, estou naquele padrão de consumidores que gasta pelo impulso, que não tem reservas. Em 2024 foi o ano que mais me robotizei nas tarefas. Pensei que era feita de fuzis, hardwares e softwares. Mas sou mesmo é de carne e ossos. Meu lado humano, consegui abstrair das faturas do cartão de crédito - estavam altíssimas.
Quanto mais me atualizo sobre os males da modernidade, mais consigo separar o que controlo do que não controlo. Neste ano consegui reconhecer como ser parte de uma demografia de consumo implicou na redução da minha felicidade geral. E quero pôr minhas mãos de carne à obra.
Por consumir muito, precisei trabalhar muito — o que atrapalhou meu sono, me fez trabalhar cansada, me tornou mais propensa ao impulso, entregue aos prazeres imediatos e mais inclinada a buscar felicidade no pix parcelado.
Agora que cortei as unhas e desabafei aqui,
estou pronta para o próximo item da lista.
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