quinta-feira, 21 de agosto de 2025

Oi, tudo bem?

Nas conversas corporativas é muito comum que nos comuniquemos de forma teatral. 

Nos e-mails? "Prezado colega, Espero que este e-mail te encontre bem.". O colega não é prezado, nunca o vi na vida. Talvez seja prezado pela família, né? Mas não por mim. E não quero exatamente que o texto o encontre bem. Quero que ele esteja bem o suficiente para liberar aquele comprovante atrasadíssimo, que me prometeu a uma hora atrás. Na verdade, quero é que o e-mail o encontre é MAL, porque fiz 40 minutos de hora extra e minha pizza está esfriando. É sexta! Tenha dó, colega!

E a ironia do "Att." ou "At.te"? Não são muito atenciosos, heim?

Eu nunca uso "Prezado". E o "Tudo bem com você", que integra a liturgia do cumprimento, me causa alergia. E o prólogo oficial dos diálogos rotineiros são tipo: "Oi, Ju. Bom dia! Tudo bem com você?". 

Mas eu detesto isso. Primeiro porque o dia não é bom; e se ninguém quer saber se está tudo bem consigo mesmo, imagina só com a equipe do Financeiro. Vamos combinar: o "Oi" só é colocado para não chegarmos falando o nome da pessoa, soando de forma autoritária.

Quando posso, portanto, deixo apenas o “Oi” e já parto para o assunto. Prefiro ser poupada de gastar as teclas do teclado respondendo que está tudo bem. Por vir de um lar de criação cristã, aprendi desde cedo a não fazer com os outros aquilo que não quero que façam comigo. Dar a outra cara à tapa, respeite o próximo como a si mesmo... ou algo nesse sentido.

É assim que inicio interações trabalhísticas: Oi, Ju. Então (e adentro no assunto). Apesar disso ser plenamente possível, quase ninguém faz. É um vício não só da língua. É um vício de uma sociedade que só Bauman explica. Testando, percebi que mesmo que eu não coloque essas introduções, ninguém realmente nota a ausência.

Acontece das pessoas estarem tão automatizadas, que mesmo quando deixo de lado o Tudo Bem Com Você Ponto de Interrogação, elas me respondem que estão bem e devolvem "E com você?". É aí que noto que o tiro saiu pela culatra. O que planejei se voltou contra mim. Agora terei que responder com Que Bom Que Você Esteja Bem, está Tudo Certo Por Aqui - mesmo que eu não tenha, sob hipótese alguma, perguntado antes.

E por qual razão respondo a esse questionamento artificial? Por quê sou arrastada para essa encenação? O intuito é não quebrar a quarta parede. É não fazer com que a pobre, cansada, exausta, semi-burnoutada, trabalhadora do outro lado daquela tela de computador note que enviou uma resposta a uma pergunta nunca, jamais feita. Para que a Ju das Finanças não abra a planilha de Excel e note que caiu vítima de um sistema fajuto dos Tudo-Bens. Para que ela não se questione sobre o porquê de não quererem saber como ela está - mesmo que ela esteja bem. Sempre bem, Obrigada.

É para salvar a Ju. Para ela nunca despertar para o fato de que nunca esteve e nem estará mal. Que ninguém estará mal: o Joca do RH, a Lua do TI, o Aristeu do Compliance e nem mesmo o Cristóvão do Jurídico, que odeia a tudo e todos e que não esconde isso dos colegas. Ninguém. Nunca. Estará. Mal. Numa resposta de mensagem corporativa.

Atenciosamente,

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