sexta-feira, 22 de abril de 2022

Bateu à porta

 Bateu à porta, e eu abri. Senhoras e senhores, toquei a maçaneta e me surpreendi. Ora, ora, se não é a felicidade! "O que eu faria contigo em minha vida?", pensei, "não saberia onde acomodá-la". De todo modo, eu disse "entre, entre", e ela entrou. 

É tudo muito simples, nada demais. Por favor, não repare a bagunça. Por fora, a casa é bonita, não é? Pelo menos não é horrível. Vamos, ah... não precisa tirar os sapatos. Entre do jeito que está. Está perfeito! Bom, por dentro, se notar, estamos redecorando, por isso a bagunça. Veja, não tenho muito a oferecer agora, sua vinda pegou-me de surpresa. Mas é uma surpresa muito bem vinda. Bem vinda! Gostaria de fazer-lhe morada, de todo coração, mas esses cômodos... Olhe bem esses cômodos! 

Na verdade, acho melhor que repares, sim, a bagunça. As pilhas de roupas ali, os livros não lidos, um tanto de sujeira do passado. Repare, sim, para que não pense que não te quero por aqui e estou a arranjar desculpas esfarrapadas. Eu é quem sou esfarrapada, enquanto você é...a Felicidade. A felicidade em pessoa, pisando nesse muquifo. Já me arrependo de tê-la convidado a entrar. Ah, vieste para ficar? Veja, como poderia eu te deixar confortável por aqui? Dormiria de pé, tenho certeza disso! 

Não.. não, o problema nunca foi e nunca será você. O problema é esta sala aqui, mal arquitetada. É este piso irregular. São estas paredes descascadas e essa iluminação caótica. Tanto ocorreu por aqui, espero que entenda, tanto ocorreu por aqui!

Olha ali, repara bem, pretendo fazer dali uma varanda, e daquelas com sacada! Pretendo reformular a decoração e reestruturar as bases, mas o processo é bastante barulhento e constrangedor. Acho que, se houvesse a varanda, poderia te acomodar por todo o sempre. Como eu gostaria de já ter essa varanda, ou talvez uma boa janela. Uma boa janela e você ocuparia tudo por aqui. Juro, dar-te-ia o prédio inteiro! Mas, por agora, este lugar não é digno dos teus pés. Vamos, agora... te mostro a saída. Cuidado para não tropeçar, sinto muitíssimo, há um trauma ali, naquele degrau. Desculpe-me. Adeus. Adeus.

Ah, foi-se embora a felicidade. Ah, como gostaria que não fosse! E foi-se, para nunca mais voltar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

E aí, o que achou?