quinta-feira, 26 de março de 2020

Queria escrever algo bonito

Já perdeu o significado da sua existência e se tornou um trem descarrilhado pronto pra ceifar a vida de diversas pessoas inocentes? Às vezes é assim que me sinto. Sou como algo pronto para explodir em mil pedaços, que se perdem como baratas tontas no meio das pessoas. Essa sou eu. Sou os mil pedaços nojentos explodidos nas caras incrédulas das pessoas.

Não sou bela, sou uma massa orgânica caótica, que está agindo de forma a se autodestruir - destruindo as pessoas que estão a minha volta. Eu só queria parar com essa bobagem e escrever algo bonito, como a beleza de... vejamos, algo que todos gostam... talvez, Ah! Como as asas de uma borboleta do campo! 

Asas coloridas e com uma arquitetura singular! Rara, raríssima! Que capturou o olhar e o interesse de nossa espécie! Observe-a flutuando no ar, delicada. Ah, mas veja só, sua singularidade foi sua sina. Suas asas foram capturadas. Oh, não!

Me perdi, essa é a sentença. A beleza fugiu de mim, porque eu não a tenho mais.Viu só? Não consigo.

Impacto

 Estávamos conversando, narrando nossas vontades juvenis e nossas histórias de corações partidos, sobre o que é certo e o que é errado. Sobre desejos e felicidade à longo prazo. Julgamos os impulsivos que se entregaram aos princípios errados, quando na verdade falávamos sobre nossa própria alma.

 E enquanto falávamos, pudemos sentir a formação de um certo bioma em nosso entorno.  E discutimos alvoroçados e rimos de muitos outros assuntos, com os olhares curiosos de uma criança, inseridos no nosso próprio universo de ideias.

 Estávamos tão próximos, que a verdade emergiu repentinamente, sobrepondo a nossa deplorável atuação, escancarando nossas tão evidentes mentiras.

 Nos envolvemos nessa doce... doce simbiose, por alguns instantes, sem conflitos, sem questionamentos. Envoltos num ar diferente, gentil. É um daqueles segundos que se pudesse, seguraria com a ponta dos dedos e o observaria por toda a eternidade, por anos e anos, fixamente, em êxtase, em alegria absoluta.

 No entanto, os instantes se somam e perpassam nossas vontades. Engolindo os sorrisos e trazendo os agouros. O tilintar do relógio, som árduo da nossa questionável moral, nos despertou, e seu perturbador ruído descruzou nossos olhos. 

 Sabe... Às vezes me esqueço quão infeliz consigo ser. Há barreiras que não podem ser derrubadas em qualquer universo, em qualquer realidade. Nem em um bilhão de anos! Se esses impasses por um privilegiado acaso, fossem inexistentes, nós não seríamos nós. Seríamos a versão feliz, diferente da real. 

 Nossa sina é que nascemos nesse exato tempo e espaço, com esses empecilhos que moldaram de maneira tão intrínseca nossas entranhas, não havendo como negociar com os fatos. É uma punição severa, imutável.

 O silêncio veio, e calamos nossas vozes, em uníssona melancolia.

 Me estremeci, assim como você.

 E continuamos conversando depois, mas agora sobre o clima.


segunda-feira, 23 de março de 2020

Eureka! Eureka?

 O livro divino deixado a nós foi utilizado por conquistadores, por poderosos, por clérigos, ficou em posse de instituições cheias de corruptos,  foi imposto aos nossos antepassados das formas mais cruéis imagináveis, no entanto, mesmo diante de toda essa incerteza histórica, devemos confiar nas escrituras cegamente, devemos seguir os mandamentos ali "colocados por Deus", à risca. Uma risca que tem diversos formatos, incongruências e contradições, tudo isso à depender da geografia de seu nascimento, das influências sociais... Muita gente já foi queimada por não crer da forma adequa... 

O...

MEU.....

DEUS!

 Me equivoquei! Estava errada! EUREKA! EUREKA! ESTÁ EM TODOS OS JORNAIS:  A ciência finalmente comprovou a existência divina, estava ali o tempo todo e agora é REAL!

 Temos um céu e um inferno, temos um corpo descartável e uma alma eterna. Temos um criador e somos suas criaturas. Seguiremos a bíblia e alçaremos os céus! Não há espaço para ceticismos ou conflitos religiosos, a paz na terra reinará.

  Deus é onisciente, onipotente e onipresente. Sua benevolência nos fez livres para adorá-lo. Seu amor é tão grande, que ele nos deu o dom da vida, moldando-nos à sua imagem e semelhança à partir do barro.

  Não há mais razões para questionar o que é perfeito, certo?

  Certo?

  Mas... só uma dúvida...

 Se Ele nos criou à sua imagem e semelhança, por qual motivo essas características biológicas em nós introduzidas pelo próprio Senhor, são por ele consideradas pecaminosas? Por lógica, se Deus moldou perfeitamente o mundo tal como é, ao mesmo tempo em que abomina sua própria criação - não há como argumentar que Ele seja perfeito, visto que o que criou, assumidamente, possui defeitos que ele mesmo impõe que sejam corrigidos.

 Isso leva a refletir ainda que, se formos criaturas de Deus, somos também seus reféns. Reféns que, sem qualquer consulta prévia, foram criados com o dever de temê-Lo e adorá-Lo, de negarmos nossa carne para vivermos num suposto espírito puro, caso contrário a condenação é o inferno, infierno, hell, l'enfer, onde tostaremos num fogo eterno, em agonia e sofrimento.

 É como uma constante arma apontada para nossa cabeça: amor ou morte! Negue os impulsos biologicamente humanos e queira ser divino - mas não um mero querer, é um querer artificialmente  natural, que deve obrigatoriamente e conscientemente partir do inconsciente de forma desobrigada - afinal, cristão mesmo é aquele que não está coagido a tanto. Pois então... É uma baita tarefa impossível seguir esse paradoxo, mas ele deve ser seguido, ou... bem, a sua batata vai assar.

 Somos também vítimas de Sua tortura, fomos colocados aqui, contra nossa vontade, em um mundo cruel, sem garantias de felicidade, sempre pressionados à testes e mais testes de fé, extremamente subjetivos, cuja resposta só virá quando não puder fazer mais nada para se redimir! Veja, um judeu na câmara de gás durante o holocausto escreveu um frase que ilustra meu ponto: "Se houver um deus, ele terá que implorar pelo meu perdão". Um absurdo amar incondicionalmente alguém nessas condições!

 Se deus tudo criou, diga-se a luz, o céu e a terra, o tempo, os sons e tudo o que existe, dentre suas criações estão tudo que é bom, assim como tudo que é mau

 Não há como acreditar que existe um deus todo poderoso, onisciente, onipotente e onipresente que seja bom, quando ele permite a existência do mal e de todo sofrimento e dor consequentes a isso. Epicuro questionou o deus todo poderoso e as características a ele atribuídas na bíblia:


"Se deus deseja prevenir o mal, mas não possui capacidade? Logo ele não é onipotente. Se ele tem capacidade, mas não deseja? Então ele é malevolente. Se ele possui capacidade e deseja? Então porque o mal existe? Se ele não é capaz e não deseja? Então por que lhe chamamos Deus?" (Epicuro)


 Seguindo a lógica religiosa, é impossível, ainda, encontrar argumentos para terceirizar essa responsabilidade de deus na criação do mal, porque ele, mesmo que não o tenha criado diretamente, possibilitou seu surgimento de forma dolosa, vez que que ele sabe de tudo o que aconteceu e que acontecerá, tamanho seu poder e força! Ele é o culpado pela câmara de gás, pela morte, pela depressão, ódio...

  Outra contradição é o tal do livre arbítrio. Se deus sabe tudo o que acontecerá, ele sabe, de antemão, desde a sua criação, se você será condenado ao inferno ou elevado ao céu. Ele criou o destino e nos enganou a crermos que tínhamos liberdade para tanto. Ele sabe quais regras você cumprirá e quais descumprirá - em todas as infinitas possibilidades de escolhas - não há contraditório e muito menos ampla defesa, está traçado seu destino "grandes coisas vão acontecer a ti!".

  Muitos conseguiram entrar no reino do céu por ignorância quanto A Palavra, agora que sabem, não tem fuga. Agora que absolutamente todo o mundo tomou ciência da existência divina, as arbitrariedades devem ser obedecidas, sem o direito de alegar desconhecimento da Lei.

Deus existe. eureka.

sexta-feira, 6 de março de 2020

Dance

 Repare como as crianças rodopiam e pulam, conhecendo o mundo a sua volta com curiosa admiração. Colocam a mão para fora da janela do carro, se encaixam nos troncos das árvores, sobem nos móveis, colocam os dedinhos na tomada, se enterram na lama! Mas à medida que envelhecemos, o que foi aprendido com tanta diversão, com tanta pureza, passa a ser utilizado para metas, objetivos, fins, de forma necessária, obrigatória e laboral.

  De segunda até domingo, nos movimentamos em horário comercial, em troca de trocados, cansados, estressados, pensando no próximo prazo, nos relacionamentos, nas dívidas. Vez ou outra, por ordens  estéticas ou médicas, comparecemos a uma academia, dojo, box, e nos mexemos sob essa intensa ameaça à saúde, às dores ou problemas de autoestima, como reféns, pagando a mensalidade sem valorizá-la integralmente.

 A vida adulta é cheia dessas questões, quando se encontra uma solução, devem-se considerar outros milhares de aspectos, de subdivisões. Deve-se calcular tudo muito bem, de forma exaustiva.

 Às vezes o esgotamento mental bate tão forte, que somos obrigados a nos alongarmos mais no banho, na cama ou na cozinha, lavando aquela pilha de louças.

 Mas algo incrível vez ou outra nos acontece - em alguns desses intervalos, aquela música sensacional aparece na rádio e invade a nossa mente, afastando ou reprimindo as responsabilidades e crises adultas. 

 Os ombros deliciosamente se remexem, os pés se firmam para acompanhá-los e você se flagra... dançando! Dançando sozinho, sem julgamentos, vivendo um momento muito especial consigo.

  Dançar é utilizar o corpo para fim nenhum a não ser aquele de se expressar. Acontecem em alguns minutos, onde não há espaço para opiniões políticas, não há formulação de filosofias, planos, ansiedades ou tristeza.

 Esses movimentos aleatórios tentam acompanhar os graves, se dramatizam nos agudos, pra lá e pra cá, no refrão, como se protagonizássemos um show espetacular, sem plateia, sem o aguardo dos aplausos ou vaias. É a pura movimentação do corpo, a aceleração do sangue nas artérias, a pulsação do coração e a lubrificação das articulações. Libera-se a endorfina, e seus músculos repuxam um sorriso, mas você não vai lá se importar com os aspectos neurológicos ou anatômicos. Você simplesmente dança, bailando nos sons.

  É espetacular, ouso argumentar que é quase divino. Isso é viver intensamente, sem a necessidade da adrenalina.

  Se você permitir se entregar ao movimento, se concentrar nos pés, pernas, braços e ritmo, é como se transcendesse os problemas terrenos, subjetivos aos universais. É você consigo mesmo, integralmente, sem distrações, divertindo-se como a pura criança que foi.

  Divirta-se.