terça-feira, 5 de outubro de 2021

A gota d'água

  Algumas solitárias gotas frias insistiam em cair pesadamente no asfalto. Aproveitou a deixa e acendeu o último cigarro, enquanto se escorava. Olhou para baixo e pensou na solidão, enquanto balançava o calçado, tão gigante, pisando naquela rua pequenininha, escurecida pela umidade da chuva. Ninguém lhe conhecia, assentiu com o trago. Sim... sim, sabiam seu nome. Poucos se alongaram ao sobrenome, e menos ainda permaneceram até o apelido, e mesmo estes não lhe conheciam. Sim... já passaram os olhos em seu sorriso e viram suas lágrimas, mas nada além das feições de seu rosto. Ouviram o tom da sua voz, mas nunca suas razões e o tamanho de suas feridas. Surgiram e sumiram (e incontáveis tantos) sem que lhe fizessem real companhia. Ser a si era seu segredo máximo, a que a ninguém interessaria contar. Era só, sim... era só. Acabou-se o cigarro em seus dedos. À distância somos chuva. Mais longe, ainda, estações. Aproximou o queixo à mão, afunilando o olhar. A gota ainda é uma gota enquanto cai, somente em seu fim se une inominada às poças que evaporam. A boca formou, então, um inaugural sorriso genuíno, e a lonjura entre a ponte e o solo já não lhe pareceu mais tão interessante, assim.  

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