Quando se ama, o outro se torna o epicentro dos sentimentos, e portanto o nosso mundo, a nossa casa, a terra em que (re)nascemos e ali formamos a nossa nova vida. O outro torna-se, de uma só vez, nosso lar e criador, e dele retiramos a validação da nossa própria existência como suas criaturas. Afinal, o que somos nós sem as leis físicas e as reações químicas do cosmos que nos forma? E no momento em que o outro ganha tamanha proporção em nosso coração, quando o outro é, de repente, o universo, a sensação é a de que alcançamos o nirvana, que somos um com o outro e unos, um, "tudo está bem, tão bem!". Meditamos nisso, nos encontramos nele, e nele nos acolhemos "esse é o incrível Cosmos". Observamos o céu em seus olhos, e é tudo tão belo nesse mundo! "Belo Cosmos!". Vai-se o sol, que esquenta e cai a noite, que aquieta e nos acolhe, vem o frio, que ameniza e então chove, molha-se o solo e nascem as flores e suspiramos "assim é o belo Cosmos!".
Tanto admiramos "Belo Cosmos!". Admiremos O Cosmos, "Belo Cosmos!" onde as brilhantes estrelas colidem, "belo Cosmos!", e então gloriosamente implodem "belo cosmos!", transformam-se em buracos negros que a tudo sugam "cosmos!" e em que os planetas se formam e as galáxias se misturam, e o tempo se confunde entre gravidades diversas, e novas formas de vida surgem e ressurgem aos montes, algumas florescem e então morrem, e outras sequer desabrocham "se ninguém as viu, foram sequer vida?". Assim é O Cosmos, assim distante, assim indecifrável, assim imprevisível, assim caótico, assim indiferente "cosmos?!".
"Indiferente cosmos!". Fantasias e delírios narcísicos à parte, o cosmos é o que é, ele existe e é tão menos sentimental e humanizável! O cosmos não se revela tido que nada tem a esconder. O cosmos não dá ou retira ou retribui, não cria ou destrói "indiferente cosmos!".
Reconheçamos! No cosmos há tudo que há "e todos aqui habitamos!". É o tecido leve, onde está costurado meu lar "nosso lar!". Nele em que existimos tantos anos antes, em que até então não deixamos de existir e em que existiremos (e hei de existir!) tantos anos além, até nossos dias acabarem. Nesse cosmos em que de fato existimos, em que somos a criatura indesejada de um criador sem desejos, onde nasceu a terra em que apoiamos nossos pés, esse cosmos findará em si, também, num dia qualquer, seja noite fria ou no alto sol do verão.
E nessa, exatamente nessa realidade, em que apoiamos os pés e formamos pensamentos, é onde nos validamos como seres da existência, "aqui!" nesse cosmos "nesse cosmos!"... que é tão diferente de mim, e com tanto em comum à você.