quarta-feira, 25 de setembro de 2019

Ponto final

 É uma dor muito grande existir, principalmente sabendo que a existência é completamente desnecessária pra mim, pro meu mundo e pro caos do universo.
 Falo demais, sinto demais. Repito as histórias. Inflamo o ouvido dos outros sem intenção com extrema frequência. Ocupo a privacidade alheia com os meus devaneios idiotas, com as minhas trapalhadas e meus exageros. Minhas personalidade é grande demais. Ela lota.
 Pensar em voltar pra inexistência (esse vazio de que viemos e para onde vamos) me atormenta dia e noite, o tempo inteiro. Por isso não sumi comigo antes.
 Eu não quero morrer. Mas vou derrubar a banqueta e quebrar meu pescoço naquele lenço verde, que costumo amarrar na janela do quarto, nos piores dias.
 Partir é sempre assim, dramático. Cheio de superlativos e apelações. É difícil, dificílimo. Quando menos se espera os pés se fixam no chão, cessando a asfixia. A mão larga o gatilho. A faca desencosta do pulso. E tudo que resta é um alívio puramente biológico, não mental. 
 A dor segue a passos largos, sempre em frente, mais e mais resistente.

quinta-feira, 19 de setembro de 2019

Filme adolescente e Epicurismo

 As vantagens de ser invisível (2012) é um filme, adaptado de um livro de mesmo nome, do autor  Stephen Chbosky. A história gira em torno "das cartas de Charlie, um adolescente de quem pouco se sabe – a não ser pelo que ele conta ao amigo nessas correspondências –, que vive entre a apatia e o entusiasmo, tateando territórios inexplorados, encurralado entre o desejo de viver a própria vida e ao mesmo tempo fugir dela".

Assisti somente ao filme, e uma cena me chamou a atenção - um monólogo do personagem principal, sobre "estar vivo", enquanto andava em um carro, com os amigos:




Sei que tudo isso não passará de histórias. E que nossas imagens se tornarão fotografias antigas. Todos nos tornaremos pais de alguém. Mas, nesse momento, estes momentos não são só histórias. Isto está acontecendo. Estou aqui, e estou olhando para ela. E ela é tão linda. Consigo enxergar. E é neste momento que você sabe que não é uma história triste. Você está vivo. Você se levanta e vê as luzes nos prédios e tudo que faz você se perguntar. Está ouvindo aquela música, naquele passeio, com as pessoas que mais ama neste mundo. E, neste momento, eu juro… SOMOS INFINITOS.



   Esse monólogo tocou, e muito, o jovem coração ateísta, do meu eu adolescente de 17 anos que assistiu esse filme em 2012. Da adolescente que passava 28h das 24h do dia, sentindo o tempo escorrendo entre os dedos, o incessante medo da morte. O texto me lembrou que, enquanto estamos vivos, temos o privilégio de sentir todos os tipos de sensações, podemos experimentar, questionar, nos revoltarmos, mudarmos. 

E mais tarde na vida, encontrei tal filosofia, bem melhor discorrida, nos livros, em especial em um chamado "Carta sobre a felicidade (A Meneceu)", do filósofo Epicuro de Samos, que adquiri em um sebo, em Curitiba.

 A "carta" foi escrita por Epicuro a um de seus discípulos, e versa sobre a conduta humana e como alcançar a "saúde do espírito". Ao contrário do que se encontra em filósofos modernos, que são mais "niilistas", Epicuro acreditava que o exercício da filosofia teria como única meta tornar feliz o homem que a pratica, e através dela logrará-se perder, totalmente, o medo da morte, aliviando, assim os sofrimentos, alcançando-se o prazer de viver.

"Enquanto sou a morte não é, quando eu não for, a morte será". 

  Para o filósofo, que refletiu sobre o fim da existência há mais de 200 anos a.C., os momentos devem ser carinhosamente experienciados, afirmava, ainda, que não havia vantagem na vida eterna, uma vez que o importante não é a duração da vida, mas a qualidade da vida. 

  Nessa mesma carta, são detalhadas diversas instruções de como se obter a paz, dentre elas, a de controlar o prazer, que não deve ser buscado indiscriminadamente, pois poderá resultar em dor; do mesmo modo, a de sofrer a dor, pois ela poderá resultar em prazer:


"(...) a prudência é o princípio e o supremo bem, razão pela qual ela é mais preciosa do que a própria filosofia; é dela que originaram todas as demais virtudes; é ela que nos ensina que não existe vida feliz sem prudência, beleza e justiça, e que não existe prudência, beleza e justiça sem felicidade. (Cartas sobre a Felicidade. p. 45)"

  Enquanto estivermos vivos, a morte não existirá, então não há razão para temer o que não existe - e nesses deliciosos momentos da existência, aproveitados com qualidade, experienciamos o prazer do infinito em um só minuto. 

sexta-feira, 13 de setembro de 2019

A música

 De onde surgiu a melodia? Quando terá sido a primeira vez em que um barulho foi alinhado de tal forma, que rearranjou-se em uma canção? Talvez nossos ancestrais a tenha a utilizado como ritual aos deuses, aos céus, ao submundo, e daí pra frente, foi sendo ela apropriada, aos gostos e desprazeres.

  E durante as eras, foi mudando as formas, cuidadosamente, descuidadosamente,  sendo censurada ou impelida, pelo autoritarismo das sociedades modernas, pelas tradições ou pela imprevisibilidade das revoluções.

 E os humanos ainda costuraram os poemas aos ritmos, e tantos outros mais foram capturados por essa estranha junção artística! E a música perdura, em maior ou menor grau de complexidade musical, tornando-se tão sólida e grandiosa, ao ponto de ser industrializada. 

  No entanto, ao menos por ora, não me importam os críticos ou as qualidades, mas sim a beleza dos sons, entrando em nossos ouvidos, através de curiosas ondas invisíveis, que de forma quase literal, tocam os sentimentos mais subjetivos que habitam nossos cérebros, que se escondem em nossos inconscientes, decodificando os desejos. 

 Como essa maravilha caótica foi transformando a crua anatomia de nossos ouvidos em mágica? 

 Um olhar, um toque, quando a música é acertadamente inserida em uma película, transforma a simples passagem de imagens e roteiros, em um filme.

  A chuva não é só chuva, quando envolvida pela harmonia dos sons. 

 Ela traduz o cotidiano para o magnífico, induzindo nossos comportamentos, dos animalescos aos rebeldes, dos amorosos aos ímpios. Conecta as almas, penetra nossas memórias. Transforma o ordinário em épico, com alguns poucos acordes.

 Me fazem pensar em você, no mundo ou na morte. 

 E tudo se torna mais importante do que realmente é.